Minecraft e a “arte do escapismo”
- kaponautas
- 21 de mai. de 2020
- 4 min de leitura
Atualizado: 11 de jun. de 2020
“A tendência da busca, ou a prática de buscar, distração do que normalmente deve ser suportado.” (definição de “escapismo” segundo o Oxford English Dictionary).

Muitos jogos em geral buscam apresentar ao seu jogador a experiência do escapismo, posso citar rapidamente: Haverst Moon, Animal Crossing, mais recentemente Stardew Valley. Alguns poderiam até dizer que o simples passatempo de jogar qualquer video game é um escapismo em si. Porém Minecraft para mim sempre foi aquele que mais me fez sentir esta sensação, de esquecer das coisas da vida enquanto exploro um mundo feito de cubos.
Freud considera o escapismo fantasioso um elemento necessário na vida humana: “Eles[humanos] não podem subsistir na escassa satisfação que podem extorquir da realidade” (FREUD, Introductory Lectures On Psycho-Analysis ; A General Introduction To Psychoanalysis p. 419). Antes de tudo o escapismo é um estado mental, que provém tanto de formas externas (principalmente artísticas como a literatura ou a música) como do próprio imaginário do ser humano, sendo este estado ,na maior parte das ocasiões, positivo, auxiliando muitos a desestressar do dia a dia ou ajudando mesmo até na luta contra depressão. Durante a Grande fome na Europa entre 1315 e 1317 contos imaginários sobre terras com comida abundante ou até mais fantasiosas como lugares que tinham sua vegetação e relevo feitos de alimentos, eram parte da cultura popular como forma de escape dos martírios da fome.

Minecraft foi lançado em 2009, tendo atualmente mais de 10 anos, um jogo que foi capaz de marcar uma geração inteira de jovens e capaz de marcar até a história da Internet. Amado por muitos, odiado por outros; sua gameplay é simples e direta a princípio. Um sandbox onde a sua criatividade é o limite, principalmente no seu modo criativo ou até mais extremamente aqueles que decidem modificar a programação do jogo a seu bem entender. Mas desejo dissertar focando o modo sobrevivência do jogo, particularmente o que mais joguei e também aquele que mais passa a sensação do escapismo para mim.
Você cria seu mundo novo e... aí já começa sua experiência. Como o jogo tem seus mapas gerados proceduralmente, muito raramente existirão dois mundos idênticos uma ao outro, tornando assim cada novo jogo uma experiência diferente da anterior. E então fazemos o básico, que todos que já assistiram gameplays do jogo no Youtube sabem fazer: pegar a madeira, pedra, construir uma casa, conseguir lã para fazer uma cama etc. E você está lá, sozinho nesse mundo cúbico, fazendo coisas como adestrar animais ou aventurar-se em cavernas profundas buscando os preciosos diamantes.
O jogo imerge o jogador em seu universo, dando total liberdade de fazer o que bem entender, enquanto passa a sua carismática atmosfera. Tudo que o jogo transmite, por mais simples que seja, faz parte dessa engenharia para prender o jogador e fazer de conta que sua vida é aquilo, e ele deve se preocupar apenas com conseguir pó de osso para fazer sua plantação de trigo crescer mais rápido. O som dos seus passos na grama, o barulho das galinhas, a clássica trilha-sonora relaxante e ambiental, os sons dos blocos enquanto estão sendo quebrados. Cada uma dessas coisas é uma pequena engrenagem que roda a máquina capaz de fazer o jogador escapar de sua realidade por um breve período de tempo.

Mas claro, natureza e músicas chill não são as únicas coisas presentes em Minecraft. É um mundo de aventura! Combater e fugir de monstros à noite, explorar cavernas profundas, defender-se dos ataques dos saqueadores e ir em busca dos recursos necessários para chegar ao “The End” e derrotar o Ender Dragon. Isso parece fugir um pouco da ideia de escapismo que apresentei previamente, porém é muito pelo contrário, essas sessões mais aventurescas do jogo servem também como engrenagem para perder-se dentro do jogo. Ou seja, além de toda a parte mais relaxada do jogo, ele também é capaz de prender o jogador em seu mundo com pitadas de ação e emoção.

Tudo isso, e ainda vale citar o multiplayer do jogo que tenho certeza muitos tiveram momentos memoráveis jogando com seus amigos no começo dos anos 2010; os mods que são colocados no jogo criados pela própria comunidade, em especial os mods que melhoram a qualidade gráfica do game, estes que, na minha opinião, só engrandece a maravilha que é esse jogo. E já que citei os mods, é bom citar a comunidade que parece que voltou dos mortos! De alguma forma ela perdeu bastante de sua força no meio dos anos 2010 mas tem voltado com força, com novos criadores de conteúdo surgindo, criações da comunidade e principalmente memes.
Acho impressionante que só como assunto esse jogo já é capaz de passar perfeitamente a “arte do escapismo” que estava me referindo, quando estiver sem fazer nada, tarde da noite tente passar um pouco de tempo num mundo novo no Minecraft e você irá perceber empiricamente do que estou me referindo.
Referências:
UNIVERSITY OF OXFORD, Oxford English Dictionary
FREUD, Introductory Lectures On Psycho-Analysis ; A General Introduction To Psychoanalysis p. 419
Comentários