Belo e trágico: Station to Station, de David Bowie
- kaponautas
- 16 de mar. de 2020
- 4 min de leitura
Station to Station é certamente o álbum mais estranho de Bowie, conseguindo ter uma beleza única, porém um background tão triste e melancólico.

O que mais chama atenção na época que David estava quando escreveu o álbum, é como era diferente de seus trabalhos anteriores. David Bowie era conhecido por incorporar personas em suas obras, em seus shows, era quase como um rock teatral, onde ele incorporava um personagem criado por ele e este era como um boneco pelo qual David era capaz de escrever suas canções com mais impessoalidade, o permitindo, ironicamente, ter maior facilidade em escrever sobre seu indivíduo em si. Pois bem, a persona que ele havia criado por mais normal que parecesse comparado às anteriores, era com certeza a mais bizarra e mórbida, o “Thin White Duke” (tradução literal: o “Fino Duque Branco”) era seu nome. Um misto de admiração e lamento, é o que sinto quando vejo ou escuto algo do Thin White Duke, um dos mais famosos personagens de David Bowie, e um dos meus favoritos. Embora que o admire, por toda sua composição artística, tanto no personagem como musicalmente, lamento de onde Bowie criou esse personagem. No momento mais sombrio de sua carreira, viciado em cocaína, morando num apartamento sombrio e influênciado por ideologias facistas embora o mesmo admita que era na verdade apenas interpretando o “Thin White Duke”, “Com alto grau de ódio próprio não relacionado ao seu alto uso de drogas ele iria taxar seu duque como ‘um ariano fascista ou algo do tipo. Um que seria romântico mesmo com nenhuma emoção se quer’” (LEIGH, 2014, n.p. tradução minha), e misticismo, foi de uma sensação de medo, melancolia e falta de esperança que o Thin White Duke tomou conta de David.

O duque teve apenas uma única aparição, no álbum Station to station, este que assim como o personagem, desenvolveu-se na mesma atmosfera na qual Bowie vivia na época. A música que introduz o álbum carrega o mesmo nome, que inicia com os sons de metrôs correndo nos trilhos, após isso, começa uma mescla de marcha militar poderosa e um groove incrível apenas para trazer a magnífica voz do duque. Na parte introdutória da letra, tem um ar místico, com direito a referências a misticismo judaico e com temática individualista. A segunda parte da música é mais rápida e aparenta ser mais alegre, porém, a letra demonstra um a desesperança para o futuro do eu lírico, afirmando que esses pensamentos não são efeitos da cocaína, mas de um amor, este que dado o tom mórbido da letra não parece se fazer presente. Em sua terceira parte ela vai até o fim repetindo o refrão: "It's to late to be grateful/ It's to late, to be late again/ It's to late to be hateful/ The european canon is here", mostrando como Bowie acredita que as ideologias facistas e nazistas chegaram aos Estados Unidos e é tarde para ter esperança.
A música seguinte, "Golden years", a qual seria o nome do álbum porém fora alterada, prossegue com a temática mais blue soul de seu álbum prévio, entretanto já com traços do que seria o Station to Station que temos hoje, mas no geral a letra fala sobre a chegada à idade dos 30. Durante as filmagens de seu primeiro longa, "The man who fell to earth", Bowie afirmou ter sido atormentado por "forças sobrenaturais", esse fato o levou até a ir em busca de um Mago Branco em New York e passou a sempre andar com um crucifixo prateado no pescoço. Daí nasceu, pra mim, a música mais bela do álbum, "World on a wing" é um pedido de socorro de Bowie a Deus, para que possa o salvar do que ele está passando, ele implora por auxílio e se faz determinado a fazer as mudanças necessárias para que seja aceito nos "esquemas de coisas" de Deus: "Oh ready to shape the scheme of things". Essa música é belíssima, o groove do baixo, o piano, juntamente com a deliciosa voz de David fazem dessa uma música admirável. Particularmente a minha favorita do artista.

A cocaína estava influenciando toda a vida de Bowie, inclusive a artística: “Na época, Bowie estava no sofrimento de interpretar o ‘Thin White Duke’, sua mais nova persona nascida claramente de sua paranoia com cocaína” (LEIGH, 2014, n.p. tradução minha). Este personagem foi baseado no papel que o Bowie interpretou em “O homem que caiu na Terra” e tinha propriedades únicas diferentes de seus outros personagens: “Apesar de não possuir nenhuma letra sugerindo que este misterioso ‘Thin White Duke’ é algum tipo de figura espiritual, seu poder, que transcende o poder dos humanos que afeta, se encaixa com outras canções espiritualistas ou de grande poder” (PERONE, 2007, p.52 tradução minha). A penúltima música, Stay, fala sobre a vida monótona viciado na cocaína, além de contar sobre a vida ficando com várias mulheres e a interação entre essas duas facetas.
Creio ter sido capaz de sumarizar este que na minha opinião, é a melhor obra de David Bowie, esse álbum é muito importante pra mim, espero ter servido de forma positiva para que outros também busquem conhece-lo.
REFERÊNCIAS
LEIGH, Wendy. Bowie: The biography. New York: Gallery Books, 2014.
PERONE, James E. The words and music of David Bowie (The praeger singer song-writter collection). Westport, Connecticut: Greenwood Publishing Group, 2007.
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